5 de março de 2010

OUROBOROS



Em algum momento certamente você foi avisado.
A esquina poderia não ter sido dobrada,
O caminho percorrido poderia ter sido o outro e não o escolhido.
Escolheste errado.

Ficastes lá mesmo onde estavas, melhor teria sido.
Não terias visto o maltrapilho encoberto pelas chagas,
Nem a mãe faminta que acabara de abandonar o filho.
Ficastes lá.

De quem é a escolha, é aleatória ou optativa?
Quem escolheria ver a vergonha, em um rosto ensandecido,
Ou vibraria ao se comparar, com o mais parco convalido?
Se for escolha, então que seja devolvida.


Fernando N.

LIDANDO COM A PERDA



A dor da perda é comum a todos nós...


Sempre estamos, dependendo a época, mais ou menos, sofrendo com a perda de algo....

E a perda não está só relacionada a morte de alguém.


Perder algo traz dor ao coração, a alma. Sofremos, choramos, gritamos, pensamos e depois, depois de muitos refletir e chegar à alguma conclusão, seguimos em frente. Mas não somos mais ou mesmos pois, tanto as perdas como os ganhos, nos moldam e nos tornam melhores ou piores do que éramos antes. Nunca iguais.


Mas o perder é uma ilusão. Uma das piores ilusões.

A ilusão é algo que acreditamos ser real, mas no fundo não o é.


Por que digo que a perda é uma ilusão?

Porque não temos nada, de fato.

Nascemos, fruto da fecundação do espermatozóide no óvulo (sem aula de ciências, até porque está parte a grande maioria já sabe né?) etc e tals...

Crescemos e passamos a acreditar que somos dono das coisas: da chupeta, do brinquedo, do berço, do quarto, da mãe, do pai, do caderno, da lancheira, do cachorro, dos amigos, do serviço, do grupo da facul, do namorado, dos filhos, do dinheiro, da casa inteira, do(s) carro(s), da conta do banco, do futuro dos filhos e , por fim, morremos de uma forma ou outra.

Isso tudo é uma ilusão pois, se analizarmos bem, no fundo, nada é nosso.

Tudo está aqui e desfrutamos do que está aqui, mas nada é nosso, pois nada é estável, tudo muda.

Qualquer pessoa que nesse momento está viva, pode ser uma criança que está nascendo neste exato momento ou qualquer um dos mais de 6 bilhões de seres humanos que vivem neste planeta, todos eles, daqui há 120 anos, estarão todos mortos, inclusive eu, é claro.


Todas as contruções que existem hoje, da casa mais simples até o prédio mais sofisticado, um dia cairão. Que esse dia chegue daqui há 1.500 anos, mas chegará. Pois o tempo é, nada mais, do que uma sucessão infinita de instantes...que classificamos como horas, minutos e segundos ( e milésimos de segundos!).


Nem este "nosso" corpo é nosso. Pois um dia ele irá morrer. Nós não morreremos, pois a vida é eterna, mas o corpo morre.Todas as células morrerão. O que restar, será devorado pelos vermes ou, caso seja cremado, se tornará cinzas que um dia também irão sumir no meio do nada....


Portanto, tocando no assunto da perda, se nada é nosso, como podemos perder algo?

Namoros conflitantes... as pessoas acham que são donas umas das outras.


" aquele é meu namorado!" dizem... mas no fundo..ninguém é de ninguém. Temos todos a livre vontade de ir e vir, ficar eu partir, ligar ou não ligar, importar ou não se importar...

Mas o ser humano é um ser egoísta, e tudo que vê e ouve quer pra si, como se pudesse controlar tudo e a todos.

Diz ANTOINE DE SAINT-EXUPÉRY, autor do Pequeno Príncipe " Amar não é uma pessoa olhar em direção a outra, mas as duas olharem na mesma direção".


Pior do que achar que coisas são suas, é achar que pessoas são suas.

O ciúmes, tão comentado por este mundo a fora, é puro resultado do medo de perder o outro...

mas se o outro tem a livre vontade de estar com a pessoa, então está porque quer..e se está porque quer, como iria perder?


Lidar com o sentimento de posse ( e consequentemente com o de perda) é algo que poucos seres humanos sabem lidar com...

Não digo que não devemos ter coisas..sim..eu mesmo adoro..as coisas que tenho..mas no fundo sei que não minhas de verdade...

O sofrer surge do perder. Quando não conseguimos algo que queremos também lidamos com a perda: um trabalho que não rolou... um filme que não conseguimos ver...um casamento que se foi..um filho que vai morar só...enfim..tudo isso...


E , uma vez que nada é nosso de fato, não deveria haver a perda.Mas como somos iludidos e achamos que tudo é nossa, sofremos.

A chave para a solução dos sofrimento está em saber lidar de forma correta com os desejos e saber que, querer ter coisas é bom, mas ser escravo delas não o é.


Hoje eu aprendi a lidar com a perda.Mesmo sabendo que o que perdi não era meu..sentirei falta do bem que me fazia, mas que, por uma série de motivos, não era mais possível " ter" o que eu tinha...

Talvez sejamos todos como uma borboleta..num casulo...antes de ser borboleta era lagarta. Em sua vida rudimentar faz o que pode para viver...mas uma hora ela decide que não dá mais e fica em seu casulo..um dia..será uma borboleta e verá como é bom voar muito além do que a tola lagarta que só caminhava..aliás..não diria tola...da pobre lagarta..pois foi com a experiência que ganhou sendo lagarta que pode, nesse dia, ser uma borboleta.


A vida segue em frente...e , como eu disse, já sou diferente do que era ontem..pois um homem não entra duas vezes no mesmo rio..já que pela segunda vez que ele entrar, nem ele, nem o rio, são os mesmos.



Rick Friano.
Publicado no Recanto das Letras em 26/12/2008
Código do texto: T1353094
(Texto de Luiz Ricardo T. Friano, São Paulo, Brasil.)